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Os bordados marcaram, desde há muito, o passado do quotidiano feminino: eram feitos como simples atividade de lazer, mas também como forma de produzir bens necessários ao dia-a-dia familiar.

Os trabalhos eram criados e executados no recato do lar, ao serão ou nas horas vagas, e, geralmente, ensinados pelas mães às filhas, herdados ou oferecidos a familiares ou conhecidos a quem se queria agradecer ou felicitar.

Uma produção industrial para comercialização e exportação só começou a instalar-se na Terceira pelos primeiros anos do século XX, trazida por industriais alemães e ingleses já instalados na ilha da Madeira, mas onde a mão-de-obra começava a ser insuficiente para atender ao volume de encomendas. A atividade foi bem-vinda à nossa ilha pois dessa forma tornava possível a ocupação da mão-de-obra feminina local para a qual não existia grande alternativa de emprego.

Em 1910 já eram cinco as agências de representantes existentes em Angra. Entre todas, nesse ano, foram responsáveis pela exportação de cerca de 300.000 peças de bordados que ocuparam cerca de 2.000 bordadeiras de toda a ilha.

Foi nessa época que se estruturou um sistema de subagências em todas as freguesias distantes da cidade para facilitar a entrega e recolha de trabalhos, além de se proceder ao desejado pagamento do serviço sem a necessidade de deslocações demoradas, sistema que se mantém até hoje.
Apesar do número de empresas existentes, do volume de trabalho e do número de braços envolvidos, na década de 1930 a indústria atravessou momentos difíceis em boa parte devidos à dependência relativamente aos industriais madeirenses: os bordados terceirenses continuavam a ser enviados em bruto para a Madeira onde eram finalizados, embalados e exportados como produto madeirense.

Será esta situação que concorrerá para que os empresários locais dos bordados se desdobrem em protestos na imprensa e em representações ao governo que procuravam demonstrar a qualidade das bordadeiras e a originalidade do produto local, muito diferente do bordado madeirense e, mesmo, do bordado micaelense: na Terceira o bordado é executado com linha branca sobre tecido de linho (ou algodão) da mesma cor utilizando, sobretudo, o ponto Richelieu, o ponto Cheio e os Ilhós, combinados como as Cavacas, o Crivo, o Ponto Pé-de-Flor, o Caseado e os Granitos.

João Evaristo de Sousa Leite (1904-1961), filho do conhecido fotógrafo António José Leite (1872-1943) foi um desses empresários. Primeiro trabalhou na firma de Herbert Pearce e, depois, na de Agostinho Raimundo de Bettencourt após o que tentou lançar-se por conta própria com uma firma de bordados que, todavia, viria a falir.

Só em 1945, já com a indústria de bordados liberta da dependência madeirense, regressa ao ramo, agora com êxito, expandindo por duas vezes a firma a S. Miguel. Com a sua morte, em 1961, a firma será explorada pela viúva, Rafaela Leite, até 1978 quando é vendida ao antigo funcionário João Carlos Pereira que, com o pai, viera da Madeira como encarregado de outras empresas de bordados, primeiro em S. Miguel e, depois, na Terceira, e que desta forma (re)funda uma nova empresa.

Hoje, a João Pereira & Filhos Lda. vai na terceira geração dedicada ao bordado. Já teve sede em vários locais da cidade, mas desde o início da década de 1980 está instalada à beira do Fanal, num local onde passamos obrigatoriamente quando vamos espairecer e esticar as pernas pela Avenida Tenente-Coronel José Agostinho abaixo. Entretanto, foi a primeira unidade produtiva artesanal a ver a sua produção certificada com o selo de qualidade que garante a origem, inteiramente local, e a qualidade dos trabalhos que vende. Por isso, possui o selo n.º 1.

Em reconhecimento do seu contributo na divulgação do bordado da Terceira, em 2017, a Câmara Municipal de Angra do Heroísmo atribuiu-lhe a medalha de mérito municipal, e com tudo isto nós continuamos a poder admirar uma arte de extrema perícia técnica e manual cujos motivos e produtos se foram adaptando aos gostos do público atual prova que o bordado também pode ser contemporâneo.



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